Capítulo II
XIII
XIII
Maria.
Foi este o nome que minha mãe me deu antes de a perder. Mulher linda. Longos cabelos loiros, olhos verdes e pele clara. Não chegou a conhecer o verdadeiro amor, não chegou a saber se ele existe ou não. Gerou-me e pariu-me. Depois morreu. Morreu carregando-me em seus braços.
Fui criada pela minha avó paterna e mimada pelo retrato de minha mãe. Meu pai? Não cheguei a conhecer. Partira em missão de paz para a Guerra sem saber da minha existência e não regressou. Quando nasci e minha mãe morreu, a minha avó paterna tomou conta de mim para evitar que eu fosse depositada na “Misericórdia”. Não por ter pena de mim, antes por temer falatórios na Vila sobre a má conduta dela e do senhor seu marido, meu avó. Homem sisudo e poucas falas, era um dos grandes capitalistas da zona. Não me lembro de um carinho, também não lembro de uma repreensão. Minha avó era diferente. Falava muito e muito alto. Usava o cabelo grisalho apanhado com ganchos e vestia com elegância. Mas não me dedicava muita atenção. Era empregada que me levava à escola, à missa ou à costureira. Até que cresci e fui estudar para Coimbra. Só regressei à Vila para o funeral de minha avó.
Fui sempre pessoa só e que amava a solidão, até conhecer António. Ainda estudava quando o conheci. Trabalhava numa clínica de psiquiatria ao pé da faculdade e ia tomar café todos os dias ao mesmo café. Jornal debaixo do braço e olhar descontraído. Cedo me enamorei pela sua figura. Meses depois casámos. Corremos o Mundo de mãos dadas e fomo-nos conhecendo melhor um ao outro e um com o outro a cada viagem. Os dias iam passando lentamente e foi lentamente que comecei a sentir uma sensação estranha. Precisava de estar com alguém, falar, ser escutada, tocar e ser tocada. Sensação estranha, o medo e ainda hoje o sinto. Nem o retrato de minha mãe me traz agora a segurança e presença de outrora.
Meu marido sempre me acompanhou. Era a ele que contava os meus medos. Conhecia-me tão bem. E só ele me transmitia paz interior. Mas a sensação de medo e dependência a ele foi-se agravando. Passei a amar o sol e a odiar o silêncio. Figuras estranhas passavam frente aos meus olhos, vozes entravam no meu cérebro e senti-me enlouquecer.
- O que vês, Maria? Diz-me o que vês.
Deitada frente ao meu marido, de olhos cerrados dizia-lhe o que via o que escutada e o que sentia.
- Tu tens um medo.
Mas com António a meu lado, esse medo ou qualquer outro medo deixava de fazer sentido.
- Enquanto aqui estiver ele não volta, Maria. Descansa, eu estou aqui.
E era assim todos os dias. E assim foi até descobrir o meu medo.
Foi este o nome que minha mãe me deu antes de a perder. Mulher linda. Longos cabelos loiros, olhos verdes e pele clara. Não chegou a conhecer o verdadeiro amor, não chegou a saber se ele existe ou não. Gerou-me e pariu-me. Depois morreu. Morreu carregando-me em seus braços.
Fui criada pela minha avó paterna e mimada pelo retrato de minha mãe. Meu pai? Não cheguei a conhecer. Partira em missão de paz para a Guerra sem saber da minha existência e não regressou. Quando nasci e minha mãe morreu, a minha avó paterna tomou conta de mim para evitar que eu fosse depositada na “Misericórdia”. Não por ter pena de mim, antes por temer falatórios na Vila sobre a má conduta dela e do senhor seu marido, meu avó. Homem sisudo e poucas falas, era um dos grandes capitalistas da zona. Não me lembro de um carinho, também não lembro de uma repreensão. Minha avó era diferente. Falava muito e muito alto. Usava o cabelo grisalho apanhado com ganchos e vestia com elegância. Mas não me dedicava muita atenção. Era empregada que me levava à escola, à missa ou à costureira. Até que cresci e fui estudar para Coimbra. Só regressei à Vila para o funeral de minha avó.
Fui sempre pessoa só e que amava a solidão, até conhecer António. Ainda estudava quando o conheci. Trabalhava numa clínica de psiquiatria ao pé da faculdade e ia tomar café todos os dias ao mesmo café. Jornal debaixo do braço e olhar descontraído. Cedo me enamorei pela sua figura. Meses depois casámos. Corremos o Mundo de mãos dadas e fomo-nos conhecendo melhor um ao outro e um com o outro a cada viagem. Os dias iam passando lentamente e foi lentamente que comecei a sentir uma sensação estranha. Precisava de estar com alguém, falar, ser escutada, tocar e ser tocada. Sensação estranha, o medo e ainda hoje o sinto. Nem o retrato de minha mãe me traz agora a segurança e presença de outrora.
Meu marido sempre me acompanhou. Era a ele que contava os meus medos. Conhecia-me tão bem. E só ele me transmitia paz interior. Mas a sensação de medo e dependência a ele foi-se agravando. Passei a amar o sol e a odiar o silêncio. Figuras estranhas passavam frente aos meus olhos, vozes entravam no meu cérebro e senti-me enlouquecer.
- O que vês, Maria? Diz-me o que vês.
Deitada frente ao meu marido, de olhos cerrados dizia-lhe o que via o que escutada e o que sentia.
- Tu tens um medo.
Mas com António a meu lado, esse medo ou qualquer outro medo deixava de fazer sentido.
- Enquanto aqui estiver ele não volta, Maria. Descansa, eu estou aqui.
E era assim todos os dias. E assim foi até descobrir o meu medo.