IV

IV


As noticias que leio no jornal impressionam - me.
Fazem a manchete com pais a violarem os filhos, mães que os deixam em casa sozinhos, vizinhos que se violentam entre si, jovens esfaqueados à porta de bares e discotecas. Todos os dias, o mesmo em cada jornal.

- Já leste isto? O meu marido exibe a página do jornal. Lembrei-me subitamente de uma professora que tive, que um dia nos confidenciou que a vizinha do lado não acreditava nas noticias macabras – «dizia ela que era pura ficção». Talvez fizesse sentido não querer acreditar, era melhor. Era bem melhor.
Não quis ler. Não quis acreditar também.

- Ainda que tente entender, não consigo. – continuou. Olhei-o e encolhi os ombros. Arrisquei – É melhor não entendermos, não pensar mais nisso, não achas?

Não me respondeu. Conheço-o. Vai pensar nisso o dia todo. Vai voltar ao assunto mais tarde. Talvez depois do jantar. E eu, eu não vou despachá-lo. Vou ouvi-lo atentamente e considerar todas as possibilidades que ele encontrar durante o dia. È assim que nos entendemos. Somos previsíveis. Adivinhamo-nos constantemente.

Hoje é feriado. Ainda assim, ele vai trabalhar.
Nunca gostei deste dia. È melancólico, triste. Venerar os que já cá não estão.
O medo de morrer apoderou-se de mim naquele momento.
Acontecia de vez em quando. Geralmente quando estava sozinha a pensar em nada em concreto, lá vinha aquela sensação desagradável. Às vezes entrava em pânico. – Calma, respira fundo e pensa noutra coisa. Não tenhas medo. Ele segurava-me na mão e com uma voz doce pedia que me acalmasse. Resultava sempre. Depois abraçava-me. Era o meu protector.
Mais tarde voltava a pegar no assunto. Devia estar a tentar perceber o meu problema. Falava dos meus sonhos, dos meus medos e depois dos meus desejos. Era agradável.
No final de cada conversa, sentia-me tão leve, tão descansada, que o medo de morrer já não fazia sentido.

Hoje ele não estava aqui. Comecei a sentir-me mal. Tive frio, tive medo.
Fazes-me tanta falta.


(continua)

4 comentários:

Anónimo disse...

Escreveu este texto antes ou depois de falar comigo?

Anónimo disse...

É que eté fiquei confuso...

Anónimo disse...

É que eté fiquei confuso...

Marta Lopes disse...

Não julgo importante...